terça-feira, 20 de julho de 2010

Solidão...




Bem, na verdade, a solidão é uma condição inerente ao homem, faz parte da vida. O detalhe é que em certos momentos, a percebemos mais agudamente e não sabemos como lidar com ela. A solidão parece estar longe quando mantemos um relacionamento muito estreito, muito íntimo, com alguém que amamos, com quem temos bastante afinidade e pontos de contato. Ou até mesmo durante uma relação sexual, em que dois são um e sentimos que é possível, de fato, uma união total entre as duas pessoas envolvidas. Mas, cedo ou tarde, chega a hora de encarar a conclusão inevitável: cada um é um. Muitas vezes nos percebemos como parte de um todo – de uma família, de um grupo de amigos, de uma comunidade. Mas chegará o ponto em que tomaremos consciência de que a realização pessoal depende de nossas próprias possibilidades. Em suma, por mais que se viva junto de quem se ama, por mais que se interaja socialmente, não será possível evitar, lá no fundo, a certeza de se ser só.

Com o outro ou em grupo, procuramos suprir as carências e a necessidade de nos sentirmos amados, desejados. Mas por estarmos com o outro ou com outros não deixamos de ser fundamentalmente sós e únicos. Em determinados momentos, acabamos por nos perguntar como a solidão nos apanhou, e porque ela dói ou machuca tanto, porém, na verdade o que acontece é que, nessas circunstâncias, entramos em confronto com algo que sempre esteve presente, apesar de escondido; a solidão. Ela sempre esteve ali. O curioso é que as pessoas que se queixam de viver muito sós falam como se fosse um problema pessoal, e não uma característica de todos nós.

Quem é que não sentiu essa espécie de vazio alguma vez, sozinho em casa? A televisão não distrai, a música, em vez de consolar, lembra situações em que havia pessoas queridas por perto, torna-se impossível concentrar-se na leitura de um livro. Mas, para alguns, basta telefonar para alguém e falar uns minutos para que mude esse panorama sombrio. Para outros, as tentativas de livrar-se da solidão ocorre de forma mais incisiva, agressiva, e até mesmo questionável ou a qualquer custo. Obviamente, nem sempre essas tentativas de aliviar a solidão são bem sucedidas, podendo assim, causar certos efeitos que não possuem muitos remédios fabricados ou receitas eficientes para com seus sintomas. A tão famosa e consideravelmente temida, ressaca moral.


Hoje, vemos uma grande inversão de valores em nossa sociedade, muitas pessoas dispostas a procurar companhia encontram alguém num bar, saem, conversam e vão fazer amor. E depois? E a tal “ressaca moral” que isso deixa? Provavelmente, nesses casos, se houver alguma lucidez ainda em nosso novo sistema de pensamento, e nessa busca desenfreada para livrar-se da solidão de ser só “eu mesmo” em frente ao espelho, perceberemos que, para suprir uma carência, passamos a procurar pessoas e circunstâncias que não possuem nenhuma ligação ou identificação conosco mesmo. Logo, o resultado de tamanha incoerência, só poderia ser uma carência ainda mais sentida, a sensação de solidão crescendo e o vazio à nossa volta ficando maior. Podemos nos justifica, é claro, argumentando que só queremos mesmo prazer e a satisfação da excitação física. Mas, se fosse só pelo prazer físico, havemos de concordar paranóicos que “o outro” seria plenamente dispensável, uma vez que a própria masturbação bastaria. Portanto é mais correto pensar que procuramos alguém para nos sentir, nem que seja por alguns breves momentos, importantes ou significantes para alguém.

As várias saídas de si mesmo nos mostram que não somos apenas um ser com sofrimentos, mas também com significado. É o sentido da própria existência que se procura quando se quer chegar a uma realização cada vez maior, quando se quer crescer afetivamente e emocionalmente, contrapondo esses ganhos aos sofrimentos que a vida traz. E nessa busca não há receitas nem modelos bons para todos. Até porque a saída muda em cada fase da vida.

É exatamente isso que esse sofrimento inerente ao ser humano tem de positivo. Ele é a mola que nos impulsiona no rumo de outras possibilidades e realizações, ou da construção de novas saídas e alternativas que gerem transformações, não só pessoais, como no mundo.

Acredito que pelo menos em parte, o fato de o número de pessoas que queixam-se da solidão ter crescido tanto, deve-se ao empobrecimento pelo qual passam as relações interpessoais, talvez pelas condições da própria vida moderna, que aglomera indivíduos sem a menor afinidade entre si. Ao mesmo tempo, o crescimento da tecnologia não trabalha exatamente a favor de relações. Nas cidades do interior, toda a gente ainda se conhece. Nas grandes cidades, quem mora num prédio não sabe quem são os vizinhos de porta; cada um conserva-se insensível às alegrias e ao sofrimento do outro. Cada um se fecha em seu próprio sofrimento e ali fica. Com isso, tendemos a criar nossos famosos melodramas alimentando essa sensação de que todos a nossa volta estão sempre ótimos, só nós mesmos é que sofremos, quase como se fossemos mártires de todos os pecados do mundo, e apenas e tão somente por isso sejamos merecedores e “tão imenso” e insuportável sofrimento particular.

Enfim, prezados paranóicos, em nossa vida, há, sem dúvida, muitos períodos críticos, de perdas tanto reais quanto aparentes, de tempestades em copo d’água e de verdadeiros furacões. Momentos em que sem dúvida, as perspectivas da condição humana se perdem e o sofrimento vence. Logo, entrar em contato com esse material sofrével e expor-se a solidão não é fácil, mas, somos seres inteligentemente criados com grande capacidade de adaptação e, sendo assim, após compreendê-la, e constatar que na verdade cada um de nós que compõe um todo é apenas único, com sua própria história, percurso, biografia, e uma maneira pessoal de procurar sentido para a sua própria vida, também se percebe estar exatamente nesse fato, á grandeza e a beleza da condição humana.

2 comentários:

  1. Nossa... Adorei! Realmente como vc comentou, rolou uma psico existencial totalis nesse post hein prima!! Hehe, mas, achei massa! Ficou bem bacana. Vc com certeza dará uma ótima, ótima, ótima psicóloga! Dá até inveja de ver o quanto vc ama essa profissão, as matérias, enfim, parabéns novamente pelos textos. Cada dia melhores!

    Beijo, Sãn.

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  2. Nunca estive tão só. Nunca estive tão perto de mim mesma.

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